Por Lorenna Rocha
Em tempos impetuosos “amem-se” é a frase que acalenta os nossos corações com o curta-metragem pernambucano Os últimos românticos do mundo (2020) de Henrique Arruda. Com seu universo referencial aos anos 1980, sua paleta de cor rosa e roxo, glitter e muito lyp sync, o filme estrelado por Carlos Eduardo Ferraz e Mateus Maia é um manifesto pelo direito de ser e sonhar num presente em que o fim do mundo já começou.
Estamos em 2050.
A vinheta do filme sobe com uma voz majestosa de um locutor. Começa a próxima cena e um inferninho em rosa e prata ganha forma na tela. A mommy da casa, que veste roupas no estilo Xou da Xuxa, está circundada de suas irmãs dissidentes e faz um culto pela liberdade. Braços para cima e a estrela da noite, a drag queen Magexy (Carlos Eduardo Ferraz), entra em cena e canta uma música de amor para seu par, Miguel (Mateus Maia). Marcando territorialidade no curta-metragem, um brega recifense rasgado, Ânsia, começa a ser dublado por ela: o homem que eu encontrei me fez feliz/ e me abriu todas as portas do amor/ me fez uma mulher realizada. O clichê do amor romântico está instalado e essa distopia em que todo mundo pode ser o que se é, amar quem se quer e seguir pelas estradas do futuro sem medo de ser feliz é tudo que estamos precisando.
O filme, cheio de referências de um grande melodrama adolescente, inventa uma parábola para reagir aos tempos embrutecidos e lacrimogêneos que estamos vivendo. Há vivacidade em todos os lugares. Não há o que se esconder. Há sexo. Há músicas cafonas. Há um lyp sync de Total Eclipse of Heart no caminho entre o Parque das Esculturas e Brasília Teimosa, com o mar no horizonte, que aparenta ser o programa perfeito para se ir de encontro ao fim do mundo. A nuvem cor de rosa que devorará tudo vai se espalhando e as poucas horas que Pedro e Miguel têm de vida são consumidas respirando amor e são anotadas num caderno para a próxima humanidade. Esse filme é uma mensagem também para os novos tempos.
No sexo, na estrada ou no banho de cachoeira, o medo do que estar por vir se mostra menor do que a vontade do que se está vivendo no agora, pois ele também é sobre o futuro. E nessa fábula, pensando no ano de 2020, nos envia uma mensagem muito mais sobre o presente do que sobre futuros distópicos.
Já existem algumas nuvens de destruição pairando sobre nós. Em tempos de intolerância e violências à população LGBTTQI+, Os últimos românticos do mundo é um respiro para aquelas e aqueles que, no hoje, vivem o medo constante de um futuro que nunca pode chegar, por serem marcadas pela angústia de terem suas vidas interrompidas arbitrariamente, e escolhem viver o presente de maneira irrestrita como forma de sobrevivência.
Ao construir multi-temporalidades na trama, descobrimos que a história de Pedro e Miguel é protagonizada por duas pessoas idosas, a partir da exibição de flashbacks do filme, que entrecruzam as imagens da dupla jovem e o casal já envelhecido. A esperança de uma vida em que se pensa que o tempo nunca acabará para eles é a mensagem de que se pode confabular uma existência de vida longa, onde todos os sonhos são possíveis, e que, mesmo em ruínas, é possível criar relações em que o afeto pode ser uma boa companhia.
Amem-se.